quinta-feira, 12 de julho de 2012

Estimação






Foi aquela foda bem dada de sempre. Dois corpos cansados e suados. Heloísa arrumava o cabelo molhado de Álvaro. Ele respirava ofegante, fumando um cigarro. Magro, imberbe, cabelo grande. Ela não fuma. A fumaça não incomoda. Acostumou-se aos hábitos. Seu corpo voluptuoso repousava, satisfeito, no lado esquerdo no corpo de poucas carnes de Álvaro. Ela é linda em todos os sentidos. Ele é apenas um filho da puta. O filho da puta que ela ama. Contradições da vida.



“Eu te amo, Álvaro”

“Heloísa, eu já te disse, a única coisa que posso te oferecer é uma foda”

“Eu não acredito que não gostes nenhum pouco de mim”

“Não é essa questão...”

“O que é então? Não acredito que não posso ser amada”

“Claro que podes, e mereces...”

“Então?”

“Mas não por mim, Heloísa”

“Tens outra? É isso???”

“Não”

“Por que, Álvaro?”

“Tu queres um marido. Uma família. Filhos. Ser feliz. Definitivamente eu não posso te oferecer essa vida cor-de-rosa”

“(...)”

“Heloísa, eu sou uma pessoa oca, rasa, abjeta. Eu preencho esse vazio com sexo, porres e leituras. É a isto que se reduziu a minha vida”

“(...)”

“A porra deste egoísmo que corrói as minhas entranhas como se fosse um câncer, que me deixa com essa queimação permanente no estômago, essa boca amarga, esse mal-estar, essa dor de cabeça, essa vontade de morrer permanente, destituindo-me de qualquer feição de criatura humana, cada vez mais eu quero me isolar da humanidade, tudo e todos me parecem intoleravelmente patéticos, imbecis, idiotas. Sobretudo, eu”

“(...)”

“Se estou deitado aqui contigo agora é por saber que tenho sexo garantido, uma boa foda garantida, e isso não é a primeira vez que te digo isso, sabes disso tudo que estou dizendo agora, nunca menti pra ti... NUNCA”

“(...)”

“Sabe, Heloísa, essa situação é foda. Eu tenho me sentido uma pessoa profundamente inútil, sou sustentado pelos meus pais, formado em Ciência da Computação, essa merda que me garantiria um emprego bacana, e foi uma das grandes burradas que fiz na vida, olho pra ti, linda, inteligente, e não sinto nada, eu me sinto um miserável, um ser desprezível, a única coisa que sinto é vergonha da vida que levo, desse vazio que preencho com a tua presença, com o teu corpo, com os carinhos que me proporcionas, com a atenção que me devotas, sem receber nada em troca, senão o uso que faço do teu amor, com um parasita, é isso mesmo, sou um verme que te parasita. Desculpe, Heloísa... já estou falando muita merda...”

“(...)”

“Sabe, eu acho melhor, tu ires embora, e não voltes mais. Por favor. Realmente, eu não sou aquilo que queres, eu sou aquilo que mereces... Caralho de merda de vida...”

“Só não me pede isso... Me deixa aqui do teu lado... É o bastante pra mim...”

“Heloísa... Por favor...“

“Álvaro, por favor, não fale mais nada... eu amo por nós dois... e isso me basta...”

“(...)”



Olho no olho. Ela chora copiosamente. Ele limpa as suas lágrimas. Cobre os corpos desnudos com lençol. Ele adormece fazendo carinhos no cabelo liso, limpo e cheiroso de Heloísa. Ela observa o seu dono, feliz pela estimação. 

(Felipov)

4 comentários:

Ricardo Bezerra disse...

felipe, entra em contato comigo. tô tentando te ligar desde a semana passada pra gente fazer a nossa troca, mas quando não atendes o teu celular ele sequer chama.meu e-mail é bezerraricardo@rocketmail.com

abraço,
ricardo

Juliana Brandão disse...

Gostei! Gostei muito!
Simples, leve e sensacional. De prender num só fôlego do início ao fim da leitura. Gosto quando escreves estórias assim ;)

Péricles Lopes Machado disse...

Seu FDP! =)

Péricles Lopes Machado disse...

Cara, eu estou me planejando para fazer uma jornada pela America Latina. Fiz as contas e creio que consigo juntar a grana em 7 ou 8 meses. Pretendo alugar um carro por um mês ou dois, e fazer uma rota até a Terra do Fogo, só viajar, só me ocupar com o caminho. Eu preciso disso mais do que nunca! Nesse meio tempo vou ver se removo todos empecilhos.

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