domingo, 22 de julho de 2012

Economia política




Todas as pessoas são infelizes – eu gritei.
Todos riram.
Brindamos a infelicidade humana.
Elas apenas não sabem disso – eu pensei.
Na verdade, tenho uma hipótese:
as pessoas se dividem quanto ao conhecimento, a ignorância e a dissimulação dessa verdade universal.
Ela ocorreu-me depois daquelas típicas conversas com o rigor conceitual da mesa de bar:
palavrões, consciência alterada e frases de efeito.
E os “pinduras”.
“Genaro, bota essas brejas na minha conta” – fala desarticulada.
Várias Cerpas Drafts.
“De novo... rapaz... daqui a pouco isso vai deixar de ser um boteco para virar uma filial filantrópica dos alcoólicos anônimos, lisos, fudidos, mal pagos”
“Eu sempre pago, Genaro” – cínico, rindo.
“Bora ver até quando...” – rindo.
“Um brinde a filantropia e a infelicidade humana. Um brinde ao grande Genaro”
Risos de bocas bem educadas, bem alimentadas, sempre desocupadas, nas quais as vidas pautam-se de sextas em sextas-feiras, com único futuro:
a próxima bebedeira.

A mesa de bar é o locus por excelência da produção de conhecimento socialmente relevante e etilicamente orientado, com inflexões apaixonadas que são verbalizadas aos gritos, palavrões e faróis baixos.
Brincadeira à parte.
Esta suposição, sem qualquer valor científico, filosófico e etcetera, pauta-se tão somente na minha observação nada rigorosa dos contatos que já estabeleci com diversos espécimes humanos, parte de uma premissa simples, óbvia diria, porém subversiva:
a infelicidade é qualidade inalienável à condição humana.
Digo mais:
demarca a sua singularidade no mundo animal.
Se eu tivesse poder, transformá-la-ia em verdade universal, ao lado do:
modelo gravitacional newtoniano,
teoria da relatividade einsteiniano,
seleção natural darwinista,
luta de classes marxista.

A (in) felicidade ou (in) satisfação de necessidades materiais/afetivas, enfim, salvo o ponto de vista do qual se parta, seja afirmativo, seja negativo, considero que a questão tenha duas dimensões:
individual ou coletiva.

No espectro de argumentação, há duas teses.
Aqueles que defendem a felicidade como o priori restrito ao indivíduo.
São as capacidades e iniciativas individuais, a famigerada “procura da felicidade”. A infelicidade, portanto, é o resultado de uma débil iniciativa individual, assim, constitui-se um ad infinitum de “procura da felicidade”, que se constitui em uma realidade de classe, o acesso aos “bens de consumo” que garantem “qualidade de vida” é diminuto e restrito, porque nem todos se esforçam o bastante, nada mais justo, os bem-sucedidos “encontrem a felicidade” tão procurada, que os demais estão a “procura”, é apenas se esforçarem o bastante que chegam lá.
É ação consciente, subjetiva, do sujeito, a priori, que determina sua existência, sua realidade material.
A felicidade é uma questão de a priori.
É acreditar ser feliz sem um prato de comida.

Contudo, há aqueles que acreditam no contrário:
a primazia coletiva da questão.
Afirmam que a garantia da estabilidade social é apenas conseguida a partir do momento que o atendimento de necessidades materiais/afetivas é satisfeita com desdobramentos coletivos, isto é, a maioria das pessoas seja satisfeitas em suas necessidades. A felicidade é a satisfação de necessidades coletivas. A infelicidade sendo apenas o seu contrário. É o todo que deve ser considerado, e não as partes de maneira isolada, salvo engano, as partes estão a priori consideradas no todo. Qualquer observância de aspectos estritamente individuais é colocar em xeque a satisfação coletiva em nome de artificial individualismo e egoísmo.
É a existência que determina a consciência.
Satisfeita necessidades materiais, a felicidade é garantida.
Não há a priori, apenas a realidade concreta.
É acreditar ser feliz apenas com um prato de comida.

É no entre-lugar destas posições que a minha hipótese, brejeira, inoportuna, cínica, apresenta-se, ao largo destas abstrações e especulações teóricas de síntese filosófica, como uma simples opinião bem informada com o rigor conceitual da mesa de bar:
todas as pessoas são infelizes, o que nos diferencia é o conhecimento, a ignorância e a dissimulação desta verdade.
Sentencio logo: a felicidade é a ignorância desta verdade.
Assim, o esforço da exposição restringe-se:
os cônscios e os dissimulados.

De maneira breve:
os cônscios são aqueles humanos com conhecimento que a vida é uma merda e guardam uma arma carregada na gaveta, que vez por outra apontam contra a própria têmpora. Covardes, nunca chegam ao fim do pensamento. Ficam fazendo esse exercício intelectual periodicamente, sem resultado.  
os dissimulados incorrem no mesmo procedimento, periodicamente, como uma roleta russa. Covardes, fazem esse exercício intelectual com a arma descarregada, sem resultado.

Minhas conclusões foram tiradas de uma disciplina nova no espectro científico:
a Economia Política de mesa de bar,
ou melhor:
a Economia Política de botequim. 

(Felipov) 

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