sexta-feira, 29 de julho de 2011

O quarto



Se você quiser conhecer do caráter de uma pessoa: observe o seu quarto. Tenho essa tese comigo. Ontem a coloquei a prova. Entrei em seu quarto. Caos: o princípio do caos. Confusão: foi a minha primeira impressão. Minha mente cartesiana se perdeu em meio a tanta complexidade – para ser eufêmico. Bagunça em progressão geométrica – para ser literal.  A desordem definia aquele micro-cosmo social que expressa o quarto de qualquer pessoa. O quarto representa, a meu ver, um dos espaços de maior intimidade de um indivíduo. Idiossincrático por definição. A expressão de qualquer individualidade. A disposição das roupas, dos móveis. A decoração. Pintura, tapete e escrivaninha. Armário, cama e cadeira. A cortina na janela regulando a passagem de luz. A janela fechada vedando a corrente de ar. A mesa desarrumada. Alguns livros. Títulos interessantes. Roupas, muitas roupas. De todos os tipos e cores. Algumas na tendência da moda, outras totalmente extemporâneas. Limpas e sujas misturavam-se dando o tom da desordem. Não somente em cima da mesa, junto aos livros, mas também, em cima da cama e pelo chão. Por sua vez, sapatos e mais sapatos – enfim, é uma mulher: muitos sapatos para poucos pés. Ao entrar e acomodar-se no quarto, além da confusão inicial, tinha-se que desviar de tanta roupa jogada, e retirar algumas delas para se sentar na cama. Sentei-me e ela começou a falar algumas banalidades da vida: que estava estressada, gorda e com fome.  Fiz um esforço tentando relacionar o que ela me dizia com o que via naquele quarto. Sobretudo, pelo que conheço de sua personalidade. O quarto era mais um índice. Um importante índice. Que me diz muita coisa. Em especial, o não dito, aquilo que não é expresso conscientemente. Bagunceira: seria a conclusão inicial. Precipitada, diria. Há pessoas que se organizam na bagunça. Dentre elas, eu – por isso, faço mea-culpa. Desorganizada? Muito provável. Indisciplinada? Óbvio. Preguiçosa? Também. Contudo, a partir das aparências, a conclusão que cheguei foi: desorganizada, indisciplinada, preguiçosa. E isso, sobretudo, porque não tem tempo a perder arrumando o quarto. Ao invés de arrumar o quarto, ela prefere viver. Ela terá tempo de sobra para arrumá-lo. Para viver, talvez. Entre arrumar o quarto e viver, ela escolhe viver. A bagunça, indisciplina e preguiça definem sua vida no momento. Ela, simplesmente, vive. Vive a bagunça da sua vida cotidiana. O caos, a confusão e a não linearidade de uma pessoa livre. A liberdade expressa em um metro quadrado.

(Felipov)

2 comentários:

Juliana Brandão disse...

Deverei ter usado esse argumento qndo minha mãe ia me visitar onde morava e smpre reclamava da desordem e desleixo que deixava a casa ¬¬
rsrs...
Adorei o s texto, Felipov!

Anônimo disse...

- Caos dentro da própria caverna é inaceitável!
Mas devo confessar que, o meu período infantil foi marcado por frases: "a cada 5 minutos que são gastos, economiza-se 1 hora" :)

Nicoly Uchôa.

Postar um comentário