quarta-feira, 18 de maio de 2011

Sentimentos





“Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor

(A flor e o espinho – Nelson Cavaquinho)



Vivo sob o império dos sentidos. Sob o império dos sentimentos. Ela é a minha vida e a minha morte. Vivo e morro, um pouco, a cada dia, sem tê-la. Sem sua simples presença. Seu corpo, sua respiração, sua ausência. Ausência por mim ternamente assimilada. A saudade que me causava. E que sabia mensurável, datada. Que só fazia crescer avassaladoramente o quereres. Desde que a conheci, minha vida mudou radicalmente. Eu não vivo mais. Existo apenas em função desse querer. Esquizofrenia, Masoquismo. Não sei. Sentimento. Paixão. Amor. Desejo. Volúpia. Eu apenas sinto. Seu cheiro. Seu toque. A sua vida, ainda pulsa em mim. Vivo às lembranças. Do que foi. O passado, indelével. Quero levantar cabeça, erguer-me. Firmar passo e seguir. Ereto, vislumbrando, no horizonte as míridias de possibilidades que me cercam. A vida que me arrasta nas suas inúmeras escolhas. No limite, contraditório, tênue de ordem e caos. Ser senhor do meu destino. Construir uma nova vida. Recomeçar. Quero. Voluntariamente. A razão. Lógica. Cálculo. Frieza. Bom senso. Dizem-me: siga Guache na vida. Contudo, os malditos sentimentos, as emoções, prendem-me aos seus grilhões passionais. Dor. Sufoco. Meu peito apertar. Quero deitar e chorar. Chorar copiosamente, como se disso dependesse a vida. Pranto abafado, interno, íntimo. Meu nariz entope de tantas lágrimas. Soluço. Olhos rubros. Boca seca e salina. Mal hálito. Água. Gole, gole, gole, engasgo, gole, gole, engasgo, tosse, tosse, tosse, gole, gole. Sinto-me cansado, de tanto chorar. A dor não passa. Durmo. Frio. Luz do Sol. Acordo. Remelento, babado, amarotado. Respiro fundo. Bocejo. A dor não passa.  Fecho os olhos. Imagens oníricas: seu carinho em minha barba, o hábito de fumar cachimbo ao ler, de cantar Cartola ao pé do meu ouvido, de fazer massagem no meu pé e estralar os seus dedos, pisar as minhas costas e eu sentir o meu esqueleto trincar, e o quanto ela se divertia, as discussões filosóficas, eu materialista, ela idealista, as literárias, eu Graciliano, ela Caio Fernando, do cinema, eu Bergman, ela Almodóvar, da música, eu Pink Floyd, ela The Doors, da política, eu esquerda, ela depende, de animal, eu gato, ela cachorro, da bebida, eu cerveja e chá, ela vinho e café. Uma torrente de imagens, com os seus respectivos sentimentos. E os meus dias transcorrem assim: existindo da memória, do sentimento. Uma coisa, é certa: tudo passa. E isso me acalenta. Esperança, mesmo que parca. Sei que não há impunidade na paixão. Vou me encontrar. Preciso ir, preciso andar. Hoje, passo com a minha dor, dissabor. Amanhã, acharei graça, decerto, do que vivi e aprendi. Futuro: aguardar-te-ei.

(Felipov)

4 comentários:

Pagliaccio Alves disse...

Bobo usando-se da meta-lingüagem pra ser malvado, existencialista e racional demais. Esse texto me deixou com raiva porque eu faço parte dessa verdade. Ai, azeda verdade. Se me tocou, acho, eu, válido. Outro belo texto.

Anônimo disse...

Hormônio e teimosia.

Anônimo disse...

Este tom de nostalgia, esse doce-veneno que o amor nos causa, essa dependência... É difícil largar... Lembro de minha história, eu literatura ele música...

Lindo Felipe, belas palavras!

Ana Patrícia disse...

Abstinência de amor é dor física. Eu sei bem. Amor vicia, maltrata. Devia ser proibido (?)Deviam alertar os incautos: "Cuidado, frágil e incerto, divino, maravilhoso. E muito perigoso!" A vida é difícil né? Ou é a gente que complica? É tudo só véu de maya (?) E o que mais ajuda a sentir (?) Uma das minhas tristezas é parecida com essa ...

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