quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Futuro

Ontem acordei de sonhos intranqüilos. Sonhei com o futuro. Porém, o sonho não me dizia nada, ou ao menos, não me lembro. E isso me angustia. Essa indefinição, esse não saber o que fazer. Querer mudanças, mas não saber como encaminhá-las. O medo de dar errado. Da derrota. Da frustração. Essa insatisfação como comigo mesmo. O sentimento de cobrança. De ser mais e melhor. A inadaptação a tudo e a todos. Não são os outros o problema. A questão é comigo. O problema sou eu. Sinto-me estranho. Quero ir embora. Constato essas coisas, mas não sei como explicá-las. O meu ímpeto de procurar explicações para tudo e não encontrá-las, me frustra um pouco. Sobretudo, quando isso diz questão a mim. Ao meu futuro. Quero, penso, cogito tantas pretensões. Almejo tantas coisas, que não sei. Nada é o bastante. Sou moderno. Quero o autodesenvolvimento. Explorar as minhas potencialidades. Busco e me preparo para as mudanças, elas são importantes e fundamentais, para dar sentido à vida. Contudo, isso tem uma relação dialeticamente intrínseca com o tempo presente, a vida presente – estais vendo, caro leitor, o meu ímpeto de buscar explicações. Ando pelas ruas. Observo as pessoas. Converso nos bares. Um sentimento de solidão me tranqüiliza. Mas, um mal-estar me invade. Como posso pensar o futuro vendo tantos problemas no tempo presente. A miséria vem todos os dias falar comigo pedindo trocados. É tanta ignorância, é tanto embrutecimento. Um dia desses recebi a notícia que um palhaço vai me representar no Congresso – nada contra os palhaços, mas não acredito que se faça política com palhaçadas. Recebi a notícia de que as crianças não sabem ler e nem fazer conta. Não só crianças, adultos também. Pessoas morrem que nem animais nos hospitais. Vi na televisão hotéis, comidas e atendimento especializado para cachorros e gatos – só faltam fazê-los ler, escrever e votar. Os animais têm mais cidadania que as pessoas – claro que os animais devem ser bem tratados. Mas, as pessoas também. São pessoas sem perspectivas nas ruas, expropriando a propriedade alheia. Insegurança total. Crianças no sinal, vendendo a infância. Escolas vazias com professores que fingem que ensinam. Pai sem emprego, mãe sem almoço. Filho sem estudo. Irmã grávida. Será que há alguma relação entre os pomposos salários ganhos por nossos representantes e os problemas sociais que vejo na televisão, sendo que o mesmo jornal no qual isso é noticiado, também exibe reportagens de como posso me vestir de acordo com as novas tendências para o inverno europeu. Ou o que devo fazer para escolher a minha empregada doméstica. Ou ainda, os cortes de cabelo masculino na moda. Será que essas são preocupações do grosso da população, ou com o que vão comer amanhã. Isso tudo me angustia. Faz-me pensar. Porque as mudanças que quero não são meramente individuais, elas são estruturais e coletivas. Talvez seja por isso que não veja o futuro tão nítido. Porque o meu futuro não está descolado do futuro da pessoa que me rouba hoje, ou me mata amanhã. Se ela me mata, acabou o futuro para mim. Como acaba o futuro de milhares de pessoas alhures. E sabe qual a minha explicação para isso: a sociedade do capital – novamente meu ímpeto. Enquanto sobrevivermos nela, não vai ter o futuro que queremos para nossos pais e filhos. O futuro no qual o extraordinário torne-se cotidiano.
(Felipov)

1 comentários:

Unknown disse...

Sempre me encontro com os mesmos questionamentos e dores em relação a miséria humana,porem acredito que essa degradação,surge pelo egoísmo humano,por ninguem querer amar os outros ou pensar no bem estar uns dos outros,EU acredito que tudo isso parta da ausencia de amor,e o amor vem de Deus,ou seja ausencia de Deus..Penso que isso que falta
Gostei muito do texto Felipov me identifico sempre!=)

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