Ela pega na minha barba. Sempre que estamos juntos, é quase um ritual: o momento da barba. Adora fazer carinho, passa as suas alvas mãos por todo o meu rosto. Seus dedinhos cálidos nas minhas sobrancelhas, fazendo o seu contorno. Com leveza, afaga-a toda, seus gestos repetitivos com as pontas dos dedos, que faz um leve ruído ao atritar com os pêlos, me dá um sentimento absoluto de paz e tranqüilidade. Ela diz o quanto gosta dela – já fez até juras de amor, com quais me diverti muito. De como é proporcional ao meu rosto. Que o meu sorriso contido fica melhor com ela. Macia, cheirosa e sedosa – é como me deixa sem graça. Até os meus beijos são mais estimulantes e saborosos com o roçar da barba nos seus lábios. Por isso, aprecia especialmente o bigode, pois é com ele que faço carinho nela, através dos beijos. Ela sabe como me agradar: é só me colocar no seu colo, pegar nos meus cabelos e acariciar a minha barba – eu viro uma criança feliz e satisfeita. Fica por horas a fazer isso sem cansar, era como se o tempo parasse a nos contemplar, observando aquele momento de terna e profunda reciprocidade, que por invejar, como punição, acelerava o cair ritmado da areia na ampulheta. São horas intermináveis de beijos e carinhos na barba, que pela inexorabilidade do tempo, acabam na sua eternidade momentânea. Sempre dizia que quando a tirava transformava-me em outra pessoa, que até de personalidade eu mudava. Não era mais seu barbudo. Adora chatear-me com a sua simples implicância. O ritual termina com ela beijando todo o meu rosto, e, portanto, toda a minha barba. O nosso amor é mediado por ela. Um amor de barba – se isso é possível.
(Felipov)
4 comentários:
Contido, auspicioso, interessante, ótimo!
Adorei o texto! Erótico, na fronteira da literatura e prazer!
Espero ver mais desses ai!
Sara
De arrepiar, de tirar lágrimas...
Adorei!
Esse texto mostra o processo de "amaducecência" da escrita do Felipov. Sua prosa que, por mt tempo, teve um ranço academicista, que em alguns momentos tirava o brilho da ideia ou da temática presente no texto, se perdia em meio a prolixidade...
"Um amor de barba" mostra o crescimento da sua escrita. Mais direta, profunda e de certa maneira, objetiva. Consigo percebe o felipov no texto como percebo nas poesias, extremamente identitárias. Quando leio as poesias, imagino o felipov lendo...
Enfim, esse novo texto em prosa merece uma estrelinha e meia, por esse eu-lírico consegui sempre me surpreender...
Quanto a temática, enfim, prefiro não comentar. Meus sentimentos por uma certa barba, são particulares...
Sem muita complexidade para definir o texto,até pq quem o faz complexo e bonito é vc....rsrs
eu adorei ^^
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